segunda-feira, 16 de julho de 2012

O PARAGUAI FUGIDIO


 
O PARAGUAI FUGIDIO


Rio – A 50 quilometros de Sacramento e a 120 quilometros de Uberaba, no Triângulo Mineiro, uma cidade que foi glória e nervo da riqueza de Minas estava se acabando, perdida no tempo e na desesperança.
          O Julgado de Nossa Senhora do Desterro do Desemboque, lá por 1800, era o portão dos campos de Goias e entroncamento do comercio do ouro. Restaram apenas duas maravilhosas igrejas barrocas inteiramente abandonadas, uma praça de capim, doze casas e exatamente 36 habitantes.
          Quem redescobriu o Desemboque foi o romancista Mário Palmério e o jornalista Mauro Santayana, que lá foram e tão fascinados ficaram que pensaram comprar a cidade para recuperar igrejas, praça, casas e o tempo.
          Lá lhes contaram uma história fantástica. Os 36 habitantes ali viviam segregados, plantando suas frutas e legumes e comendo o que brotava do chão. Uma manhã, alguém perguntou ao vizinho que dia era. Não sabia. Foram de casa em casa, ninguém sabia. As folhinhas estavam amarelecidas e já não diziam nem os dias, nem os meses, nem os anos. O jeito foi mandar um portador a cavalo até Sacramento para buscar o dia.
          O dia veio. Fugidio, mas veio.

                                                   PARAGUAI

          Mario Palmerio, o romancista telúrico dos clássicos “Vila dos Confins”,  “Chapadão do Bugre” e outros, foi um homem múltiplo e um amigo único. Formado em filosofia pela USP (Universidade de São Paulo) e em medicina pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), ensinou matemática, fundou as faculdades de Odontologia, Medicina, Direito e Engenharia e a Universidade de Uberaba, foi deputado federal (PTB) de Minas de 1950 a 1962, entrou para a Academia Brasileira de Letras, aprendeu sozinho a tocar piano, morou anos em um barco no rio Amazonas e foi embaixador do Brasil no Paraguai, de 1962 a 1964.
          Lá, criou o “Colégio Experimental”, concluiu a “Ponte da Amizade” (Foz do Iguaçu),  compôs garanias que se tornaram patrimônios nacionais : “Saudade” (até hoje uma das musicas mais tocadas e cantadas no Paraguai),  “Non Digas No”, “Assuncion”. E deixou historias maravilhosas.        
                                        
STROESSNER
De noite, tocou o telefone na embaixada do Brasil em Assunção:
          - Dom Mário, estava precisando falar com o senhor.
- Pois não, presidente Stroessner.
- Pode passar aqui pela manhã? Às cinco.
- Da manhã?
- Sim. Chego ao Palácio às cinco.De manhã é melhor para conversar.
- Presidente, em nome da amizade do Brasil com o Paraguai essa conversa não podia ser às 11?
Foi às onze.

                              SAPEÑA PASTOR
Mário Palmério fez da Embaixada do Brasil em Assunção um abrigo de políticos e intelectuais da oposição.
Uma tarde chega o então ministro do Exterior, Sapeña Pastor:
- Senhor embaixador dom Palmério, nosso país deseja e precisa manter as melhores relações possíveis com o Brasil. Mas o senhor tem aqui na embaixada, asilados, mais de 40 inimigos do regime, e isso está causando os maiores problemas para o governo. O senhor não podia tomar uma providência para ajudar meu ministério e nosso governo?
- Pois não, Sr. Ministro, já estou tomando.

                                 PALMERIO
- Qual, senhor embaixador?
- Vamos lá em cima, no segundo andar, para o senhor ver a beleza de apartamento que estou preparando para asilados de luxo.
- Mas esta é uma brincadeira de mau gosto, senhor embaixador.
- Não é, não, senhor Ministro. O general Stroessner, seu presidente, em outros tempos já foi hospede aqui da embaixada do Brasil. O senhor, em qualquer eventualidade, também pode contar conosco.
Sapeña Pastor saiu e nunca mais tocou no assunto.
          O Paraguai, com o pífio golpe parlamentar que derrubou o presidente Lugo, mostrou que continua asilado em um tempo cada vez mais fugidio.

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