quinta-feira, 9 de abril de 2009

Especial: ''Maluf'' de Londrina transfere voto para eleito

por Marli Lima, de Londrina

Das 32 cidades que já realizaram novas eleições, a maior é Londrina, segundo mais populoso município paranaense, de 500 mil habitantes. E confirmou o rumo da maioria das cidades que voltaram às urnas depois da disputa municipal do ano passado. O terceiro colocado na eleição de outubro de 2009, o deputado federal Barbosa Neto (PDT), foi eleito no domingo, 29 de março, com o apoio do ex-prefeito cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o deputado estadual Antonio Belinati (PP).

No gabinete que ocupa em Curitiba, Belinati costuma alertar os visitantes. "Cuidado com o golpe da cadeira. Ela era do Barbosa, já derrubou muita gente." Belinati teve sua candidatura invalidada pelo TSE dois dias depois da eleição, por problemas na prestação de contas em 1999. O tucano Luiz Carlos Hauly, também deputado federal, obteve a segunda colocação nos "três turnos" realizados desde outubro.

Na teia que envolve Belinati e Barbosa há mais coincidências que o uso do mesmo gabinete e o fato de terem atuado na área de comunicação, como apresentadores de rádio e televisão. Depois de perder no primeiro turno, Barbosa decidiu apoiar Belinati. Quando o vencedor teve a candidatura impugnada e novas eleições foram marcadas, surgiram em Londrina adesivos em automóveis que orientavam os eleitores de Belinati ao voto nulo.

Pesquisas mostravam Barbosa e Hauly tecnicamente empatados, enquanto Belinati continuava a buscar meios jurídicos para tomar posse. Mas, com a proximidade da nova eleição, o último comício de Barbosa foi marcado na região chamada de Cinco Conjuntos (ou Cincão), ao Norte do município, reduto eleitoral de Belinati e uma das áreas mais populosas. Lá, três dias antes de as urnas serem usadas pela terceira vez, Barbosa cedeu a Belinati o direito de falar por último. No começo, ele disse aos moradores que não havia desistido de brigar pelo cargo, mas depois pediu votos para Barbosa.

"Tive de fazer uma opção como cidadão, mesmo não concordando com o terceiro turno", diz Belinati que, no Supremo Tribunal Federal, vai tentar usar o princípio de segurança jurídica para fazer valer sua eleição. Os números finais das urnas mostram que o apoio de Belinati pode ter sido decisivo para a vitória de Barbosa Neto. No primeiro turno, Belinati teve 28.498 votos na zona eleitoral 157, que inclui o Cincão, erguido na região Norte da cidade em sua passagem pela prefeitura, nos anos 80, contra 7.469 de Hauly e 12.013 de Barbosa. No segundo turno, Belinati conseguiu 38.557 votos e Hauly, 17.605. Na semana passada, foi lá que Barbosa disparou, com 36.430 votos, contra 15.451 votos de Hauly. O crescimento de Barbosa ali foi de 203%, o maior verificado nas sete zonas eleitorais do município. No fim, Barbosa conseguiu 54,12% dos votos válidos (135.507) e Hauly, 45,88% (114.867).

"Não tive mérito nenhum", desconversa Belinati, sobre o desempenho de Barbosa na região Norte, que atualmente conta com mais de 20 conjuntos habitacionais mas que surgiu no meio de cafezais, com a construção de casas do extinto BNH. "Difícil falar sobre hipóteses, mas não quero ser ingrato", responde Barbosa, ao ser questionado se teria vencido sem o apoio do candidato cassado. "O mérito é do Barbosa", opina o senador Osmar Dias, presidente do PDT no Paraná e pré-candidato ao governo em 2010. Hauly, que critica a atuação da justiça no processo, diz que o apoio de Belinati a Barbosa "fez parte do pacote" de estranhezas da eleição. "O eleitor não tem informação sobre os 93 processos que o Belinati responde, não sabe separar o joio do trigo", afirma, sobre ações cíveis e criminais que o político acumulou nas três vezes em que foi prefeito - Belinati foi cassado em 2000, acusado de desvio de verbas municipais.

Conversas com taxistas e moradores do cincão revelam que, embora Belinati não seja unanimidade, é o preferido. "Só votei no Barbosa por causa do Belinati, senão ia anular meu voto. Ele pode ser ladrão, como dizem, mas deixou muita lembrança", disse o aposentado José de Jesus Neto, um dos primeiros moradores do local. "Eu penso que ele ainda vai ser prefeito", completa, sobre o desejo de que político vença na Justiça. O pedreiro Manoel Rodrigues de Andrade, que chegou há 10 anos, engrossa o coro. "Se o Belinati se candidatar 500 vezes, vai ser eleito aqui 500 vezes." Dona de uma lanchonete, Neide Olegari ouve dos clientes que a presença de Belinati no comício mudou as coisas. "Foi decisivo", afirma Willian Martins, que tem uma loja de confecções. Tal influência não é bem vista por alguns. Para Neide Silva, presidente da Associação do Comércio e Indústria da Região Norte, a população confunde as coisas, porque acha que foi o Belinati quem deu as casas. "É uma questão de idolatria", compara. "Não temos de ter um dono." Diversos moradores disseram, ao Valor, que Belinati para Londrina é como o Paulo Maluf para São Paulo, "rouba mas faz".

Enquanto o prefeito eleito não toma posse, a cidade é comandada pelo padre José Roque Neto (PTB), presidente da Câmara, que gostou da experiência e já pensa em ser candidato em 2012. "Não podemos deixar a cidade parada, esperando uma decisão, por isso estamos fiscalizando e cobrando ações", diz o vereador Jairo Tamura, presidente em exercício da casa. A diplomação de Barbosa deve acontecer até o dia 28 e, a posse, no começo de maio. Enquanto aguardam as próximas cenas das eleições, políticos e moradores não descartam uma nova reviravolta, caso Belinati consiga reverter a situação no STF. "Estamos confiantes na vitória, nem que a questão se arraste até o fim do mandato", diz Belinati.

Barbosa, que também é investigado na Operação Gafanhoto, por desvio de salários destinados a servidores, diz que vai seguir o que a Justiça mandar, sobre o prazo para renunciar ao mandato de deputado federal. Sobre o fato de ser apoiado pelo candidato cassado, ele faz uma declaração bíblica: "Não julgue para não ser julgado". Nos últimos oito anos Londrina teve administração petista, com Nedson Micheletti, e tanto Belinati como Barbosa dizem que o município tem sérios problemas econômicos a enfrentar.

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