quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Marina Silva: um novo olhar sobre o Brasil

por Leonardo Boff
Erram os que pensam que a saida da senadora Marina Silva do PT obedeçe a
propósitos oportunistas de uma eventual candidatura à Presidência da
República. Marina Silva saiu porque possuía um outro olhar sobre o Brasil,
sobre o PAC (Programa de Acelaração do Crescimento) do governo que
identifica desenvolvimento com crescimento meramente material e com maior
capacidade de consumo. O novo olhar, adequado à crescente consciência da
humanidade e à altura da crise atual, exige uma equação diferente entre
ecologia e economia, uma redefinição de nossa presença no planeta e um
cuidado consciente sobre o nosso futuro comum. Para estas coisas a direção
atual do PT é cega. Nã o apenas não vê. É que não tem olhos. O que é pior.

Para aprofundar esta questão, valho-me de uma correspondência com o
sociólogo de Juiz de Fora e Belo Horizonte, Pedro Ribeiro de Oliveira, um
intelectual dos mais lúcidos que articula a academia com as lutas populares
e as Cebs e que acaba de organizar um livro sobre "A consciência planetária
e a religião" (Paulinas 2009) Escreve ele:

"Efetivamente, estamos numa encruzilhada histórica. A candidatura da Marina
não faz mais do que deixá-la evidente. O sistema produtivista-consumista de
mercado teima em sobreviver, alegando que somente ele é capaz de resolver o
problema da fome e da miséria ­ quando, na verdade, é seu causador.
Acontece que ele se impôs desde o século XVI como aquilo que a Humanidade
produziu de melhor, ajudado pelo iluminismo e a revolução cultural do século
XIX, que nos convenceram a todos da validade de seu dogma fundante: somos
vocacionados para o progresso sem fim que a ciência, a técnica e o mercado
proporcionam. Essa inércia ideológica que continua movendo o mundo se cruza,
hoje, com um outro caminho, que é o da consciência planetária. É ainda uma
trilha, mas uma trilha que vai em outra direção".

"Muitos pensadores e analistas descobriram a existência dessa trilha e
chamaram a atenção do mundo para a necessidade de mudarmos a direção da
nossa caminhada. Trocar o caminho do progresso sem fim, pelo caminho da
harmonia planetária". "Esta inflexão era a voz profética de alguns. Mas agora,
ela já não clama mais no deserto e sim diante de público que aumenta a cada dia.
Aquela trilha já não aparece mais apenas como um caminho exclusivo de alguns
ecologistas mas como um caminho viável para toda a humanidade. Diante dela,
o paradigma do progresso sem fim desnuda sua fragilid ade teórica e seu dogma
antes inquestionável ameaça ruir. Nesse momento, reunem-se todas as forças
para mantê-lo de pé, menos por meio de uma argumentação consistente do que
pela repetição de que "não há alternativas" e que qualquer alternativa "é um
sonho".

"É aqui que situo a candidatura da Marina. É evidente que o PV é um partido
que pode até ter sido fundado com boas intenções mas hoje converteu-se numa
legenda de aluguel. Ninguém imagina que a Marina ­ na hipótese de ganhar a
eleição ­ vá governar com base no PV. Se eventualmente ela vencer, terá que
seguir o caminho de outros presidentes sul-americanos eleitos sem base
partidária e recorrer aos plebiscitos e referendos populares para quebrar as
amarras de um sistema que ³primeiro tomou a terra dos índios e depois
escreveu o código civil", como escreveu o argentino Eduardo de la Cerna".

"Mesmo que nã o ganhe, sua candidatura será um grande momento de
conscientização popular sobre o destino do Brasil e do Planeta. Marina Silva
dispensará os marqueteiros, e entrarão em campanha os seguidores de Paulo
Freire".

"Esta é a diferença da candidatura Marina. Serra, do alto da sua arrogância,
estimula a candidatura Marina para derrubar Lula e manter a política de
crescimento e concentração de riqueza. Lula, por sua vez, levanta a bandeira
da união da esquerda contra Serra, mas também para manter a política de
crescimento e de concentração da riqueza, embora mitigada pelas políticas
sociais".

"Marina representa outro paradigma. Não mais a má utopia do progresso sem
fim, mas a boa utopia da harmonia planetária. A nossa visão não é restrita a
2010-2014. Estamos mirando a grande crise de 2035 e buscando evitá-la
enquanto é tempo ou, na pior das hipóteses, buscar alternat ivas ao seu
enfrentamento.

É por isso, por amor a nossos filhos, netos e netas, temos que dar força à
candidatura da Marina. E que Paulo Freire nos ajude a fazer dessa campanha
eleitoral uma campanha de educação popular de massas".

Digo eu com Victor Hugo:
"Não há nada de mais poderoso do que uma idéia cujo tempo já chegou".

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