segunda-feira, 23 de maio de 2011

Palocci entregou Francenildo aos Marinho, diz ex-diretor da Globo

O ministro-chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, ex-ministro da Fazenda do primeiro governo Lula, teria negociado com as Organizações Globo, em 2006, a divulgação do “dossiê Francenildo”, que violava dados bancários do caseiro Francenildo Costa. É o que afirma, de Londres, o jornalista Paulo Nogueira, que era diretor editorial das Organizações Globo, respondendo por revistas como Época, Época Negócios, Marie Claire e Quem.

Em seu blog, Nogueira — que foi afastado do comando das revistas, numa disputa interna, há pouco mais de dois anos — tem publicado posts sobre o episódio. “Foi o Palocci quem passou para nós o dossiê calunioso”, diz. Segundo o jornalista, os herdeiros do magnata Roberto Marinho negociaram diretamente a publicação do dossiê — a revista Época publicou os dados com exclusividade.

“Palocci foi quem fez chegar a nós, na redação da Época, informações que supostamente desqualificariam um caseiro de Brasília que dissera que ele frequentava uma mansão pouco recomendável quando ele era ministro da Fazenda. Na época, eu era diretor editorial das revistas da Globo, a principal das quais era e é a Época. Foi um dos episódios mais desagradáveis de minha carreira”, continua o jornalista.

De acordo com o relato do ex-diretor da Época, o dossiê não foi levado diretamente aos jornalistas — mas, sim, à cúpula das Organizações Globo. “Muitos políticos preferem conversar diretamente com os donos, e não com os jornalistas. Não é uma peculiaridade brasileira. Churchill só falava com os proprietários quando era primeiro-ministro do Reino Unido.”

Nogueira afirma que a revista Época não se envolveu nessa operação totalmente ciente da fraude. “Imaginávamos, ao publicar a história, que de fato tinham sido feitos depósitos na conta do caseiro. Logo ficou claro que não. Também ficou clara em pouco tempo a desfaçatez de Palocci ao dizer que não fizera o que fez.”

Em entrevista ao Brasil 247, Nogueira detalhou a operação contra Francenildo. “A história precisa ser escrita com correção”, diz. Sua denúncia, se confirmada, põe em xeque uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Em 27 de agosto de 2009, Palocci foi inocentado no STF, por cinco votos a quatro, da acusação de quebra do sigilo bancário. A culpa recaiu sobre dois outros réus: seu assessor de imprensa, Marcelo Netto, e o presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Mattoso.

Os dados bancários de Francenildo, expostos pela revista Época, permitiram uma devassa na vida privada do caseiro e revelaram até que ele era um filho não reconhecido. Os depósitos atípicos, de R$ 24 mil, foram feitos pelo pai biológico para tentar encerrar uma ação de reconhecimento de paternidade.

Confira abaixo a entrevista.

Brasil 247: Como chegou à redação da Época o dossiê Francenildo?
Paulo Nogueira: O assunto foi levado diretamente pelo ministro Palocci à cúpula das Organizações Globo.

Brasil 247: Quando você diz cúpula, a quem se refere? Ao Ali Kamel, o diretor de jornalismo?
PN: Não, o Ali Kamel respondia pela televisão. Eu me refiro aos acionistas.

Brasil 247: À família Marinho, portanto.
PN: Isso.

Brasil 247: E qual foi a motivação?
PN: Estávamos todos naquela briga das semanais, competindo pelo furo da semana. Só depois ficou claro que a revista Época foi usada como instrumento do ministro Palocci.

Brasil 247: Mas, quando surgiu também um crime, uma quebra de sigilo bancário de um indivíduo pelo Estado, você não pensou em abrir uma discussão sobre quebrar o sigilo da fonte e revelar que o ministro Palocci estava por trás de tudo?
PN: Aquilo seria um constrangimento para todos nós, e para a própria revista. E em qualquer empresa existem limitações. Além do mais, tem a vida que segue, a semana seguinte, o projeto de uma nova revista...

Brasil 247: Mas por que só agora você decidiu trazer este caso a público?
PN: Uma indignação, o desejo de que meus filhos vivam num país melhor. Tem um conceito do George Orwell que eu admiro muito: decência básica. Só isso. E agora, aqui em Londres, num período sabático, tenho mais liberdade. A história brasileira precisa ser escrita com correção. E fato é: o dossiê Francenildo foi levado à cúpula da Globo pelo ministro Palocci.

Brasil 247: O ministro Palocci foi inocentado no caso e a maior parte da culpa recaiu sobre os ombros do seu assessor Marcelo Netto.
PN: O Marcelo Netto tratou do assunto com a sucursal Brasília da Época. Todos sabiam que ele agia a mando do Palocci.

Brasil 247: Mas o fato é que ele foi inocentado no Supremo e voltou à vida pública. Se esse processo fosse reaberto, a pedido, por exemplo, do caseiro, você diria as mesmas coisas em juízo?
PN: Evidentemente, eu respondo pelo que eu escrevo. Estou em Londres e no próximo ano estarei de volta ao Brasil.

Da Redação, com informações do Brasil 247

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