segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Calil: filmes marginais são lição para o cinema brasileiro atual

Os filmes da Coleção Cinema Marginal Brasileiro deveriam ser lição de casa obrigatória para os diretores em atividade no país. Não apenas por serem itens fundamentais e pouquíssimos vistos da nossa história audiovisual, como também por oferecerem uma aula sobre a importância do erro a uma cinematografia hoje obcecada com a perfeição técnica.

Por Ricardo Calil, na Folha.com

Depois da primeira leva de quatro DVDs lançada no começo do ano, chegam às lojas mais dois volumes, com os filmes Hitler 3º Mundo (1968), de José Agrippino de Paula, e Lilian M - Relatório Confidencial (1975), de Carlos Reichenbach. Mais conhecido como autor do romance Panamérica (1967), o paulistano Agrippino fez Hitler com sobras de rolos, de forma clandestina e na base do improviso. Nunca lançado comercialmente, tornou-se um mito do cinema marginal.

Como Panamérica, o filme é feito de estilhaços pop, episódios aparentemente absurdos e desconexos que misturam Hitler, Cristo, o (personagem de quadrinhos) Coisa e Jô Soares. Este encarna um samurai-gueixa que, entre outras coisas, enfia crianças faveladas em uma Kombi, tenta arranhar uma TV e comete haraquiri, contracenando com pessoas reais e provocando um curto-circuito entre ficção e documentário.

Com problemas evidentes de áudio, iluminação e continuidade, o filme é exemplo acabado de como a precariedade pode funcionar como estimulo à invenção -e não como um impedimento.

Experimentos
Segundo longa-metragem de Carlos Reichenbach, Lilian M já traz elementos que marcam a obra do cineasta: as referências cinéfilas, o vaivém entre gêneros, a defesa da liberação feminina. A narrativa articula-se a partir do depoimento da protagonista (Célia Olga Benvenutti) sobre seus amantes, a partir do momento em que abandona o marido no campo, foge com um caixeiro-viajante e conhece a cidade grande, seus tipos e perigos.

Embora seja mais estruturado e menos precário que Hitler 3º Mundo, Lilian M é igualmente libertário por suas experimentações com diferentes gêneros e suas sofisticadas brincadeiras sonoras e visuais.

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