quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Sem ajuda, pobreza em Gaza subiria 42%

Mesmo com apoio externo, proporção de pobres cresce em razão do bloqueio israelense, que limita livre movimentação, aponta relatório
UN Photo/Stephenie Hollyman


da PrimaPagina

Os maiores obstáculos enfrentados pelos palestinos, que nesta semana retomam as negociações de paz com Israel após 20 meses de interrupção, são a divisão política interna e a ocupação israelense — em especial os obstáculos à livre movimentação entre a Faixa de Gaza, a Cisjordânia e Jerusalém Oriental. Esses fatores têm sido decisivos para aumentar a pobreza nos últimos anos e para que boa parte da população local dependa de ajuda externa para sobreviver, afirma o Relatório de Desenvolvimento Humano dos Territórios Palestinos Ocupados, elaborado por acadêmicos da região e publicado pelo PNUD.

A porcentagem de palestinos abaixo da linha nacional de pobreza na Cisjordânia subiu de 19,8% em 2004 para 23,6% em 2007, de acordo com dados do Escritório Central de Estatísticas da Palestina apresentados no documento. Na Faixa de Gaza, a proporção saltou de 37,2% para 55,7% no mesmo período. A situação é em parte aliviada pela ajuda externa: segundo levantamento do Banco Mundial, sem contar a assistência internacional, a parcela de pobres sobe para 79,4% em Gaza e 45,7% na Cisjordânia.

Essa tendência à dependência se reflete nos números do PIB (Produto Interno Bruno, soma dos bens e serviços produzidos na localidade ): a economia palestina vem crescendo por causa das ajudas externas, mas os investimentos caíram para níveis alarmantes, deixando uma pequena base produtiva na região. Em 2007, as doações representaram 5% do PIB, contra 30% no ano seguinte.

A deterioração das condições na região tem impacto na fome, que afetava 34% da população em 2006 e 38% em 2008. Um levantamento do Programa Mundial de Alimentação da ONU apontou que metade dos palestinos dos territórios ocupados sobrevive graças à diminuição de suas despesas com alimentação, e 89% das pessoas tiveram de abrir mão do consumo de frutas frescas, vegetais e proteínas animais por razões financeiras. Os palestinos estão comendo menos, aponta o documento, com os pais reduzindo sua alimentação para sustentar os filhos.

Ainda assim, a taxa de mortalidade de crianças abaixo dos 5 anos, que vinha caindo desde a década de 90, voltou a subir. Em 2006 e 2007, foram 27 mortes por 1.000 nascimentos, assim como em 1990. Em 2008, o número aumentou para 28,2.

“Muitos palestinos recebem ajuda alimentar suficiente para se sustentar (isto é, seu direito à alimentação é cumprido), mas, como eles são incapazes (em razão de obstáculos econômicos) de ganhar dinheiro suficiente para se alimentar, continuam em estado de dependência”, analisa o relatório. “Não se trata de uma pobreza provocada por insuficiência, mas por perda de autonomia.”

Ocupação israelense

O relatório vê na forma de ocupação israelense o grande obstáculo para o desenvolvimento humano dos territórios. “Até que os palestinos possam ter controle total sobre a economia e o meio ambiente, especialmente controle sobre a política macroeconômica, o comércio, os meios de vida, as fontes de água e as fronteiras, o desenvolvimento sustentado continuará sendo ilusório”, afirma o relatório.

Israel controla espaço aéreo, águas territoriais, recursos naturais, movimentação e instrumentos macroeconômicos na região. O texto alerta que, se os direitos dos trabalhadores continuarem a ser reduzidos por causa da ocupação, o mercado de trabalho vai se retrair continuamente em todos os setores — incluindo agricultura e pesca, que atualmente empregam uma significativa parcela da população, mas estão sofrendo um declínio em razão do acesso restrito à terra e à água.

Antes do bloqueio à Gaza, em 2007, a agricultura empregava 40 mil pessoas. A produção era direcionada para a demanda doméstica, mas uma pequena parte era exportada. Porém, a restrição de acesso a fertilizantes paralisou esse tipo de atividade desde 2007.

Já o setor industrial ocupava cerca de 35 mil pessoas. Porém, o controle das importações, necessárias para a aquisição de 95% das matérias-primas e 80% das maquinarias, faz com que 98% das operações industriais na região estejam hoje inativas. As transações bancárias em Gaza, que representavam 40% do montante palestino, hoje correspondem a 7%.

A fragmentação do território palestino e os obstáculos ao trânsito de pessoas — decorrência diretas da ocupação israelense — colaboram para enfraquecer a Autoridade Palestina e, por tabela, intensificar os conflitos políticos internos. “Um território dividido em enclaves pequenos e desconectados, sujeitos ao cerco econômico e militar de Israel, incapazes de prover justiça à sua população dispersa, e sem seus mais sagrados símbolos religiosos e de identidade, dificilmente será viável ou funcional”, aponta o texto. “Quanto mais a autoridade central e as instituições centrais de governança estão desgastadas, maior o potencial para a polarização política. A consequência é que as diferenças políticas não são resolvidas democraticamente, mas por meio da força.”

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Se não tiver conta no Google, opte por "Comentar como: Nome/URL", sendo que o campo URL não precisa ser preenchido.

Não serão tolerados ataques pessoais.