terça-feira, 29 de junho de 2010

CONTO: O ESPECIALISTA

Por Honorival Teixeira

Tenho o maior respeito pelos especialistas. Quando você precisar saber alguma coisa consulte um. Ele terá prazer em falar sobre o que gosta e sabe. No momento que se tornar “chato”, mude de assunto.

Tenho um amigo especialista em vinhos. Já me contou muito sobre regiões onde a uva é de qualidade e anos especiais em que a safra produziu a melhor uva para fabricar o néctar de prazer do “Deus Baco”. O clima ideal, o grau de maturação das uvas, o teor alcoólico da bebida, são temas de sua preferência. Sabe detalhes que, creio, sem muita importância, mas com que cuidado ele destaca.

Só não falamos muito sobre e evolução dos ‘frisantes’ nacionais, que nos últimos anos foram significativos e ambos sabemos com clareza.

Outro ponto sem discussão é a “guerra” do Espumante, entre Santa Catarina e Rio Grande do Sul, porque estamos ambos do mesmo lado e concordamos que Santa Catarina tem razão.

Disse a ele, em mais de uma oportunidade, que dos vinhos que custam entre catorze e quarenta e oito reais, eu não consigo distinguir grandes diferenças. Das garrafas que custam cinqüenta, oitenta, ou mais de duzentos reais, eu não posso opinar, pois “não falo sobre o desconhecido”.

Outro dia encontrei, em um supermercado, o meu especial amigo que entende de vinhos. Estava sequioso para ouvir sobre as “vitis viníferas 2009” que estão maravilhosas.

Antes mesmo de me cumprimentar, o amigo olhou, em geral, em mim e meu carrinho e disparou:

-Você está de namorada nova? (Na verdade, a pergunta era se eu tinha namorada de pouco tempo).

Atordoado, depois de confirmar desajeitadamente, recomecei a empurrar o meu veículo de compras, pois o assunto, ainda meio tabú, não me era nada agradável.

Como soube? Quem deve ter-lhe contado? Eram as perguntas que latejavam.

Depois de um desfile, em minha cabeça, de pessoas amigas e principalmente parentes que foram devidamente “xingadas”. Individualmente acrescentei débito ou deduzi crédito, de um em um, a todos eles.

Não agüentando mais, me dirigi ao corredor de vinhos onde certamente encontraria o meu amigo.

E cobraria o nome do “canalha ‘dedo’ duro” que havia “entregue” ou divulgado acontecimento tão sagrado.

Claro que não perguntei, com tanta veemência como pensava em ‘esganar’ a pior de todas as pessoas que passou pelo meu pensamento. Até porque, o ‘castigo’ se alterava conforme o carinho maior ou menor que eu tinha, ou recebia, de cada um que desfilava para receber o veredito sobre o ‘crime’ praticado. Penalidades diferentes, imposta pelo único julgador, para um mesmo crime cometido.

Exatamente porque não estava sendo justo no meu julgamento, já estava sendo brando em meu pensamento quando encontrei o amigo, e perguntei, até suavemente.

- Como soube? Penso que usei apenas duas palavras para ser o mais ríspido possível e ser claramente entendido.

A resposta, em tom professoral, em energia de um mestre e a cadência de um sábio, veio em palavras incisivas e contundentes.

- Foi fácil!, muito fácil. E acrescentou, sorrindo.

- Para quem conhece você, ver você com um carrinho de supermercado comprando vinho Demi-sec, só pode estar apaixonado!

Tenha muito respeito pelos especialistas. Mas, tomem cuidado! Eles são um perigo!

4 comentários:

  1. Carvalho30.6.10

    Parabéns seu boia pela iniciativa de deixar o blog mais leve com uma boa crônica!

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  2. Fábio30.6.10

    detalhes que só os especialistas reparariam!

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  3. Mara1.7.10

    Gostei muito da crônica! Inteligente,sensivel como você é.Senti um pouco de ciúme....

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  4. Danton4.7.10

    agradável como um bom vinho. foi bom ter lido depois do Brasil sair da copa.

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